Maurício Costa Romão, Ph.D. em economia, é consultor da Contexto Estratégias Política e de Mercado, e do Instituto de Pesquisas Maurício de Nassau. mauricio-romao@uol.com.br. http://mauricioromao.blog.br.
As últimas pesquisas do mês de setembro de 2010 apontavam nítida redução da vantagem em intenções de voto de Dilma Rousseff sobre a soma dos adversários, sinalizando que a eleição não se definiria no primeiro turno, como esperavam os petistas e aliados.
À época havia mais dois fatores de apreensão para as hostes situacionistas na eleição presidencial: (1) o provável aumento da abstenção; (2) o eventual crescimento da incidência de votos nulos e brancos.
Sobre o primeiro fator, o próprio PT entrou no Supremo Tribunal Federal (STF) com ação para que a Corte declarasse inconstitucional a exigência de dois documentos – o título e um documento com foto – habilitando o eleitor a votar.
O partido temia que o eleitorado mais simples, de baixa escolaridade e renda, segmento com maior propensão a votar em Dilma Rousseff, principalmente o residente do Nordeste e Norte do País, acabasse comparecendo em menor número às urnas, provocando grande abstenção.
Já a preocupação com os votos brancos e nulos, que não constava da mencionada ação, derivava do fato de que a eleição daquele ano envolvia certa complexidade, notadamente para o eleitor mais simples, de se votar em deputado estadual, deputado federal, senador (duas vezes), governador e presidente. Existia, assim, a possibilidade de haver maior incidência dos votos brancos e nulos, relativamente a outros pleitos majoritários anteriores.
Percebe-se, então, a grande apreensão dos aderentes à candidatura líder era com a diminuição de votos para suas hostes, posto saber-se que variações na abstenção e nos votos brancos e nulos são fatores que, isoladamente ou em conjunto, afetam os votos válidos. O propósito desse breve texto é mostrar como isso pode acontecer, usando as relações que envolvem as variáveis-chave das eleições: eleitorado, abstenção, votos brancos e nulos e votos válidos.
Designando o eleitorado por EL, a abstenção por AB, os votos apurados por VA, e os votos brancos e nulos por VB e VN, respectivamente, tem-se:
Votos apurados = Eleitorado – Abstenção
VA = EL – AB
Denominando os votos válidos de VV:
Votos válidos = Votos apurados – Soma de votos brancos e nulos
VV = VA – (VB + VN)
Dividindo os dois lados desta última equação pelos votos apurados (VA), tem-se:
VV/VA = 1 – [(VB + VN)/VA]
Como 0 ‹ (VB + VN)/VA ‹ 1, toda vez que aumenta a proporção de votos brancos e nulos no total de votos apurados, diminui a proporção de votos válidos nesse total e vice-versa. Assim, um aumento da incidência de votos brancos e nulos, como proporção dos votos apurados, afeta negativamente a fração dos votos válidos e uma diminuição, positivamente.
Note-se que é importante fazer sempre referência à proporcionalidade relativa aos votos apurados. De fato, é incorreto dizer, por exemplo: “um aumento dos votos brancos e nulos diminui os votos válidos”. Essa ocorrência vai depender do que acontece com os votos apurados. Se a incidência de votos brancos e nulos cresce na mesma quantidade dos votos apurados, então os votos válidos não se alteram. Se crescer mais que os votos apurados, os votos válidos diminuem. E se crescer menos, os votos válidos aumentam.
Para averiguar o impacto da abstenção sobre os votos válidos, considere-se novamente a seguinte relação:
VA = EL – AB
Daí se conclui que:
VA/EL = 1 – AB/EL
Então, sempre que a abstenção aumenta, como fração do eleitorado, os votos apurados diminuem proporcionalmente e vice versa. Entretanto, a assertiva antes anunciada refere-se à relação entre abstenção e votos válidos, daí por que é necessário um passo adiante.
Já se sabe que :
VV = VA – (VB + VN)
Dividindo os dois lados da equação pelo eleitorado, chega-se a:
VV/EL = VA/EL – (VB + VN)/EL
Substituindo VA/EL por (1 – AB/EL), obtém-se:
VV/EL = 1 – AB/EL – [(VB + VN)/EL]
Dessa forma, o aumento (diminuição) da abstenção relativamente ao eleitorado diminui (aumenta) os votos válidos como fração desse contingente, mantida ceteris paribus a proporção dos votos brancos e nulos no total do eleitorado.
Em outras palavras, só se pode estabelecer como a abstenção impacta nos votos válidos observando-se o que acontece com os votos brancos e nulos.
É possível ver-se, ainda, o efeito conjunto de, suponha-se, um aumento dos votos brancos e nulos combinado com um acréscimo da abstenção sobre os votos válidos. Rearrumando o segundo termo da equação anterior:
VV/EL = 1 – AB/EL – [(VB + VN)/EL]
VV/EL = 1 – [ AB + (VB + VN)]/EL
Assim, pode-se deduzir dessa última relação que o crescimento conjunto de AB e (VB + VN), diminuem os votos válidos, todos com proporção do eleitorado.
Conclusão: (1) há uma relação inversa entre os votos válidos e os votos brancos e nulos, como proporção dos votos apurados; (2) a abstenção também se relaciona negativamente com os votos válidos, ambos como fração do eleitorado e (3) os votos brancos e nulos e a abstenção, conjuntamente, variando no mesmo sentido, guardam relação inversa com os votos válidos.