O voto útil favorece o processo democrático?

O voto útil favorece o processo democrático?

Por Adriano Oliveira – Doutor em Ciência Política. Professor da UFPE. Fundador da Cenário Inteligência: Pesquisa qualitativa e Estratégia.

Pesquisas qualitativas realizadas pela Cenário Inteligência mostraram que na eleição presidencial de 2022, o eleitor dizia admirar outros candidatos, como Simone Tebet e Ciro Gomes. Todavia, escolhia Lula ou Bolsonaro porque não acreditava na vitória do seu candidato principal. Nesta eleição, as qualitativas também revelaram que o bolsonarismo é produto do antilulismo, ou seja: você votou em Bolsonaro com o objetivo de não permitir a volta de Lula à presidência da República e nem todos que votaram em Lula são lulistas ou petistas. Eles queriam impedir nova vitória do então presidente da República.

Nas eleições municipais deste ano, as pesquisas qualitativas encontraram vários depoimentos de eleitores afirmando que apesar de não gostar do prefeito, votaria nele para que o ex-prefeito não voltasse ao poder, já que esse era pior do que o atual. Quando indagado sobre um outro competidor (3°via), eles afirmavam que não votariam porque não teria chance de vencer, embora fosse uma boa alternativa.

Os eventos apresentados são exemplos de voto útil. Eles estão presentes em diversos pleitos eleitorais. E não é de hoje. Contudo, diante da disputa entre bolsonarismo e lulismo, o voto útil ficou bem nítido, já que ambos são fenômenos com alta rejeição. Esclareço que a polarização entre bolsonarismo e lulismo não é fenômeno recente e exclusivo. Em milhares de cidades brasileiras, a polarização existe e produz o voto útil. É comum encontrarmos os amarelos versus vermelhos, os laranjas versus azuis. A polarização causa o voto útil. A presença de candidatos com alta rejeição é causa do voto útil.

São diversas as pesquisas quantitativas que indagam sobre quem vai ganhar a eleição. A resposta advinda pode contribuir também para o voto útil. Parcela do eleitor pode fazer a opção de votar em quem está na frente (variável intenção de voto), ou seja, quem tende a vencer. Especialmente no Nordeste, observo fenômeno relevante: a prefeitura exerce força centrípeta entre os eleitores. Mesmo que o prefeito tenha alta reprovação, ele tende a chegar com chances nos dias finais da campanha. O ser prefeito traz vantagens entre seus adversários, em particular, em cidades pequenas e médias.

A distribuição de benefícios, especificamente, empregos e favores na área da saúde, são instrumentos que garantem a força centrípeta da prefeitura sobre o eleitor. Então, mesmo o prefeito tendo alta reprovação, o eleitor opta pelo voto útil para garantir a permanência dos benefícios presentes em seu cotidiano. Simples: O eleitor reclama do prefeito e gosta do adversário dele. Todavia, em virtude do emprego de um parente ou uma cirurgia, opta por garantir a reeleição do prefeito. Neste caso, a gratidão orienta o voto. Mas é também um voto útil.

O voto útil é, portanto, estratégia de campanha por parte do eleitor e faz parte da democracia eleitoral. Ele é a garantia da liberdade do votante e revela a sua sabedoria política. O eleitor é ser emocional e racional. Essas duas categorias estão presentes no ambiente da eleição e conduzem ao voto útil. A rejeição a um candidato possibilita que Pedro vote no candidato A – Escolha emocional. O benefício que Sandra recebe do prefeito X, lhe incentiva a votar nele novamente, mesmo que ela não aprove a sua gestão – Escolha racional.

A democracia eleitoral é um sistema imperfeito. Nem sempre produz o melhor resultado. Mas na democracia, o eleitor é soberano e estratégico.

Por
publicado 29/10/2024 - 09h20