A política brasileira vive momentos de crises partidárias que não escolhem legendas, mas, no entanto, diferem entre si e, nessa diferenciação está a explicação para o sucesso dos situacionistas e o fracasso dos oposicionistas.
O PT acaba de escolher um novo presidente, o deputado estadual Ruy Falcão, à revelia da presidente Dilma e, mais que isso, um presidente partidário que está em litígio judicial com um dos principais ministros do governo, o do Desenvolvimento Social Fernando Pimentel, amigo da presidente.
O enfrentamento dos dois vem desde a campanha presidencial, numa briga de poder que explodiu quando foi descoberta uma organização paralela dentro do comitê de imprensa para fabricar dossiês contra o candidato oposicionista e também para vigiar companheiros petistas.
Como naquela ocasião, também agora a crise foi abafada com o intuito de não prejudicar o objetivo maior do partido, que anteriormente era eleger uma candidata que não havia sido escolhida pelos petistas, mas representava para eles a única chance de manter o poder.
Hoje, a presidente eleita não conseguiu impor ao partido seu candidato, o senador Humberto Costa, não se sentiu com forças para contestar a decisão, e finge que está tudo bem, à espera do momento em que o exercício da presidência lhe dê musculatura suficiente para se impor ao PT.
Caso contrário, seguirá tendo que aceitar as imposições de um PT disposto a cobrar cada palmo de terreno que considerar seu por direito político.
É bom não se esquecer que quem está por trás da manobra bem sucedida que colocou Ruy Falcão na presidência do partido é o ex-todo poderoso José Dirceu, ele também disposto a recuperar todo o terreno perdido depois que foi cassado e acusado de “chefe da quadrilha” do mensalão pelo Procurador Geral da República, em denúncia aceita pelo Supremo Tribunal Federal.
O mesmo Dirceu que, em uma palestra para sindicalistas durante a campanha presidencial, disse que a vitória de Dilma na eleição seria a primeira grande vitória do PT, pois Lula era maior do que o PT, e Dilma precisaria do partido para governar.
Ele começa a mostrar na prática o que quis dizer e, embora o ambiente esteja fervilhando dentro do PT, tudo parece estar às mil maravilhas para consumo externo.
Até mesmo a polêmica volta do ex-tesoureiro do mensalão Delubio Soares aos quadros do partido, do qual foi expulso na crise de 2005, também apoiada pelo grupo de Dirceu, está provocando menos marola do que seria de se supor.
A discussão está colocada dentro do partido, mas em termos muito amenos, como podemos ver no texto de Carlos Henrique Árabe, Secretário Nacional de Formação Política do PT, que, mesmo discordando, faz um apelo à unidade partidária, revelando o que realmente está em jogo para os petistas, a manutenção do poder:
“Recolocar o tema para a mesma instância é solicitar ao Diretório Nacional uma autocrítica e uma condenação da decisão tomada anteriormente. Mais do que isso, é reabrir uma questão que, a seu tempo, teve a solução que mais nos unificou”.
É bem verdade que Carlos Henrique Árabe retoma um tema que não deve ter agradado a Dirceu, ainda mais agora quando o julgamento do mensalão se aproxima da definição. Ele diz que o PT, no 13º Encontro e no 3º Congresso, encontrou um caminho de unidade “com posições críticas aos acontecimentos de 2005 e com posições de superação daqueles equívocos”.
E diz que foi um erro histórico do PT se recusar a realizar um processo interno “para se constituir um juízo comum sobre o que foram os acontecimentos que produziram a crise de 2005”.
Por isso, diz ele, a direção do PT não tem uma opinião comum sobre a crise. “Existem várias versões, um largo espectro de opiniões, mas não uma compreensão comum. Este fato enfraquece a defesa do partido como projeto coletivo”.
Mas, afirma Árabe em seu manifesto, não houve dúvidas sobre a atuação de Delúbio Soares como Secretário Nacional de Finanças “documentada no processo interno. Os termos ali utilizados são duros. Invalidar a decisão anterior do Diretório Nacional é, necessariamente, recolocar todo o debate de volta”.
Outro aspecto de muita importância, salienta o dirigente petista, “é que existem muitos processos constituídos por diferentes poderes públicos sobre os dramáticos acontecimentos da crise de 2005 e os seus atores. Muitos aguardam julgamento do Supremo Tribunal Federal”.
Frente a eles, o PT deve ter uma posição de defesa partidária. E aí vai contar a capacidade de unir o partido. A proposta de refiliar Delúbio em nada contribui para isso”.
Enquanto o PT procura a união partidária, mesmo às custas da verdade, o que fazem os principais partidos de oposição?
O PSDB se engalfinha em uma luta fratricida, onde surge o governador Geraldo Alckmin com o espírito rancoroso e vingativo que era atribuído ao ex-governador José Serra.
E a dissidência partidária centrada no DEM que alimenta o novo PSD do prefeito Gilberto Kassab não representa nenhuma tomada de posição ideológica, como foi, por exemplo, o surgimento do PSOL em discordância com o PT, mas apenas um aglomerado de políticos mal acomodados em seus partidos que viram a nova legenda como uma válvula de escape em direção às benesses governamentais.
Quando o PSDB surgiu da costela do PMDB, em protesto contra o fisiologismo que dominava aquela legenda, tinha uma proposta de renovação política que chegou ao poder com o Plano Real.
Hoje, as disputas não passam de vinganças mesquinhas ou de fisiologismo mal resolvido, sem um pingo de grandeza.
Mesmo que seja apenas o poder pelo poder, o PT é o único partido político brasileiro que tem um projeto.